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sábado, 11 de fevereiro de 2012

Uma política de Estado


Não são poucas as vezes que escutamos que vivemos em uma democracia e que no Brasil as instituições do Estado democrático do direito estão em pleno processo de amadurecimento. Mas, como revolucionários que lutamos contra o Estado burguês e suas instituições, temos a obrigação de fazer uma crítica contra essa concepção, principalmente porque o que temos visto no país é um recrudescimento do processo de repressão contra os trabalhadores de conjunto. Todo movimento tem recebido por parte dessas mesmas instituições um tratamento que sequer lembra a democracia burguesa.
A esse discurso soma-se uma forte propaganda dos pseudos valores universais da democracia (burguesa, claro). É evidente que esse discurso tem como objetivo ganhar os trabalhadores para que acreditem que essa democracia é a única possível e que representa toda evolução da humanidade. Mas sabemos que o objetivo dos ideólogos burgueses se restringe a valorização dessa democracia e que a burguesia continue a dominação sobre a maioria da sociedade.
Na atual situação política destacamos o fato de que a repressão aos trabalhadores e ao movimento social tem aumentado. São exemplos os despejos judiciais de comunidades inteiras para a liberarem terrenos para construção de instalações para a copa do mundo em 2014 e para as olimpíadas de 2016, a política higienista contra os moradores de rua na região da cracolândia, os ataques às ocupações urbanas de São Paulo, as ações policiais na USP e no Pinheirinho, a política de fortalecimento de serviços de informação nas polícias e tantas outras.
Nesse quadro também incluímos as medidas repressivas (corte de ponto, desconto nos salários, descumprimento de decisões judiciais) dos governos federal e estaduais contra as mobilizações de trabalhadores públicos e as decisões da justiça do trabalho em diversas regiões do país impondo ainda mais restrições à realização de greves.
Há, portanto, um endurecimento do regime contra os trabalhadores e suas mobilizações. Vale destacar que não se trata de um ataque só de um ou outro governo estadual ou mesmo do governo Dilma, nem só do Poder Judiciário ou da polícia, mas do conjunto das instituições do Estado burguês brasileiro. É uma política da burguesia e o Estado o seu fiel aplicador.

O significado da democracia burguesa
Mesmo com esse nome, isso não significa de maneira nenhuma que os regimes políticos próprios da burguesia sejam democráticos, pelo contrário, com distintas variações de forma, representam uma ditadura. Convivem com garantias democráticas mínimas na sociedade um regime extremamente ditatorial nos locais de trabalho com a completa impossibilidade de os trabalhadores terem qualquer liberdade, impossibilidade de os trabalhadores e suas organizações terem acesso aos meios de comunicação, um sistema judicial formado por membros da burguesia ou seus simpatizantes, um sistema policial de controle sobre os trabalhadores e o povo pobre e também um grande esquema de propaganda ideológica para garantir a reprodução dos valores burgueses.
Outra característica dos regimes democráticos burgueses é que eles existem principalmente para a defesa da propriedade privada e da conseqüente exploração do trabalho alheio e com isso negam aos trabalhadores e ao povo pobre o direito elementar de ter acesso a empregos, moradia, viver decentemente, etc.
Essa democracia só funciona efetivamente para os ricos. Para os trabalhadores ela representa de fato uma ditadura: a do capital, pois seus mecanismos não permitem aos trabalhadores exercerem qualquer controle sobre os governantes, aparato estatal e, principalmente, sobre a economia.
Não seria razoável dizer que a democracia burguesa funciona da mesma forma em todos os países. Nos países periféricos do sistema, onde o desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção é extremamente precário, para garantir um duro regime de exploração, a repressão (legal ou não) sobre os trabalhadores é muito maior. Uma prova são os inúmeros golpes militares que países da América Latina e da África sofreram no século XX.  Essa é, ao nosso modo de ver as coisas, a explicação do porquê o Brasil nunca ter vivido uma “democracia burguesa avançada”.

Endurecimento do atual regime democrático burguês no Brasil
O atual estágio da democracia burguesa no Brasil é parte de um processo que chamamos de reação democrática, período em que a burguesia brasileira fez a opção de substituir a ditadura militar por um regime político que pudesse ter legitimidade perante os trabalhadores, uma vez que os militares não tinham mais condições de impor o projeto de dominação.
A instituição da democracia burguesa no Brasil permitiu que a burguesia fizesse uma ampla campanha de valorização dos valores universais da democracia e de que assim todos seriam iguais. Os perseguidos sabem que essa democracia trata de maneira bem diferenciada os trabalhadores e os lutadores.
As medidas de repressão adotadas atualmente têm, regra geral, em maior ou menor grau, respaldo jurídico pelo sistema judiciário, demonstrando que essas medidas não se enquadram em qualquer espécie de ruptura democrática, mas são parte integrante da democracia burguesa. Ou seja, têm respaldo no próprio sistema institucional em vigência. Medidas ditatoriais não são necessariamente ilegais, pois elas podem ocorrer em base ao sistema legal, demonstrando que a democracia burguesa no Brasil tem como elemento estrutural um amplo arcabouço permissivo para a repressão.
O endurecimento do regime também pode ser verificado no fato de que algumas vezes sequer a legalidade tem sido respeitada, como é o caso do Pinheirinho, que no momento da ação policial ainda não tinha sido resolvida a questão da legalidade e mesmo assim o governo Alckmin resolveu atacar os trabalhadores e seu direito à moradia.
Um traço característico desse endurecimento é que essas medidas são também aplicadas pelos setores que outrora foram perseguidos pela ditadura militar e agora são agentes desse projeto de repressão, demonstrando mais uma vez que a sua integração ao Estado está além dos interesses econômicos, integrando também seus aspectos ideológicos.
Esse processo de restrição de direitos democráticos é parte de um processo que envolve vários países com distintos níveis de repressão aos movimentos sociais, como é o caso da Argentina em que há vários militantes perseguidos judicialmente.
São características de tempos de crise econômica e social o deslocamento da burguesia para regimes políticos mais repressivos. Nesse processo de perseguição e repressão aos trabalhadores e ao movimento social em geral, a burguesia está procurando frear e ameaçar os que lutam e resistem aos ataques aos direitos dos trabalhadores, necessidades prementes da burguesia para enfrentar a crise econômica que se avizinha ao país.
Entretanto, a caracterização de endurecimento do regime democrático burguês contra os trabalhadores não quer dizer a certeza de golpe militar no próximo período, principalmente pelo fato do atual regime estar cumprindo – e bem- o papel de garantir a estabilidade política e a dominação da burguesia.

O papel do Poder Judiciário
O Poder Judiciário é uma das bases do poder político da burguesia, pois é o que garante à força suas ações contra os trabalhadores. Dito de outra forma: é um poder da burguesia que age e atua em defesa dos princípios do poder político da burguesia.
O poder judiciário só existe porque vivemos em uma sociedade de classes, com profundas desigualdades sociais e a ele cabe “administrar” essas desigualdades, pois o “direito é uma medida da desigualdade”.
Seja em um regime democrático burguês, seja em uma ditadura, lá estão os homens de toga para legitimar a ação da classe dominante. Foi assim no período escravagista, quando todas as decisões legitimavam a propriedade de um homem sobre outro; foi assim no Estado Novo, em que condenava-se os inimigos políticos do regime varguista;  assim também aconteceu na ditadura militar, condenando os militantes que ousavam enfrentar a ditadura; atualmente, o regime sustenta ações como policiais contra os estudantes da USP, contra o povo pobre do Pinheirinho ou ainda quando, atacando o direito de greve, decide que trabalhadores do Metrô têm de garantir o funcionamento de 80% dos trens.
Nesse momento, o Poder Judiciário cumpre um papel fundamental para as pretensões da burguesia e para o momento de criminalização do movimento social, demonstrando que sequer a chamada (inexistente) independência dos poderes tem algum valor para a burguesia.

O interesse do proletariado nas questões democráticas
Mesmo essa limitada democracia só é defendida pela burguesia enquanto ela garante estabilidade de sua dominação, ou seja, a burguesia não tem nenhum apego a qualquer forma de democracia, pois estão preocupados com a garantia de que continuarão a ser a classe dominante, seja sob a forma democrática oseja sob a forma ditatorial. A democracia é tática para a burguesia, defendem-na apenas e tão somente enquanto é útil para a sua dominação. Basta vermos a nossa história e teremos a certeza de que toda vez que o seu poder esteve (mesmo que levemente) ameaçado lançou mão de regimes ditatoriais como foram o Estado Novo e a ditadura militar pós-64.
A defesa das conquistas democráticas é uma tarefa fundamental para o proletariado e também para os revolucionários, mas isso não quer dizer que tenhamos qualquer ilusão nessa democracia. O desafio que temos é ajudar o proletariado a desenvolver uma consciência socialista e que possa impulsionar lutas não mais para as “questões democráticas”, mas para as questões sociais e para a democracia operária (única democracia verdadeira).
Uma questão que deve ser destacada nessa discussão é que, se não defendemos a democracia burguesa como a “verdadeira democracia”, também não estamos a favor que os poucos direitos democráticos sejam retirados, pois se eles existem não é por vontade ou convicção da burguesia, mas porque, no caso do Brasil, foram conquistados com imensas mobilizações operárias e populares de fins da década de 70 e início dos anos 80. A depender da burguesia, sequer essa “democracia sem direitos” teríamos.

Opor à democracia burguesa a democracia operária
Só aos trabalhadores interessa o desenvolvimento de condições de vida mais avançadas. A burguesia nunca vai cumprir essa tarefa. Assim, diante do atual nível de consciência, da ilusão da classe trabalhadora na democracia burguesa e dos ataques aos direitos democráticos, é fundamental que levantemos bandeiras democráticas mais radicais até como forma de ajudar os trabalhadores a superarem as ilusões que ainda mantém na ideologia burguesa.
Defender essas bandeiras não quer dizer em hipótese alguma ter confiança na democracia e nas instituições burguesas; pelo contrário, elas são inimigas dos trabalhadores. Por isso que, junto com essas bandeiras, pensamos ser fundamental que elas sejam levantadas em combinação com a mobilização, com uma intensa propaganda (e em alguns casos de agitação) e com experiências práticas de construção da democracia operária como regime político dos trabalhadores.
Esse é o grande desafio: lutar pela radicalização dos direitos democráticos sem que isso signifique criar ilusões na democracia burguesa, dando a essa luta uma delimitação de classe, sem se esquecer que “as fórmulas da democracia não são mais que palavras de ordem passageiras ou episódicas no movimento independente do proletariado e não um nó corrediço democrático colocado no pescoço do proletariado pelos agentes da burguesia” (Trotsky, Programa de Transição).
Assim, em cada luta, a intervenção dos revolucionários deve estar marcada pelo desenvolvimento de bandeiras e formas de organização que levem a classe trabalhadora ao questionamento dos fundamentos da democracia burguesa e à aproximação com a democracia operária, como regime político do poder operário.

A necessária unidade dos lutadores
Uma das questões que julgamos como decisiva na luta de classes no Brasil é a necessária e urgente unidade dos revolucionários para enfrentar o poder dos governos e do capital. Nesse momento, em que as instituições –legais e ilegais- da burguesia se unem para atacar os trabalhadores e lutadores, essa unidade ganha muito mais importância.
O inimigo já demonstrou suas intenções e agora cabe a nós militantes da esquerda construirmos uma resistência unificada para enfrentar essa onda de ataques aos direitos democráticos e sociais dos trabalhadores.

Fonte: Espaço Socialista.

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